Nas últimas semanas, não foram poucas as ocasiões em que membros do mundo da Fórmula 1 citaram a MotoGP como exemplo a ser seguido. Mas, afinal, o que a categoria hoje dominada pela Mercedes pode aprender com a irmã mais velha?

O Mundial de Motovelocidade chegou aos 70 anos no último dia 13 de junho em um momento bastante saudável. Hoje formado por três categorias ― Moto3, Moto2 e MotoGP ―, o certame da FIM (Federação Internacional de Motociclismo) vive uma fase de alta competitividade e tem, especialmente em sua classe rainha, um exemplo a ser seguido pelas demais categorias do esporte a motor.

Nas últimas semanas, não foram poucos os membros do paddock da F1 a apontarem a MotoGP como modelo. Consultor da Red Bull, Helmut Marko foi ainda além e admitiu que tentou convencer Carmelo Ezpeleta, diretor-executivo da Dorna, a se candidatar ao comando da série rival

Mas, afinal, o que a Fórmula 1 poderia aprender com a MotoGP? O GRANDE PREMIUM listou dez pontos que ajudaram a classe rainha da motovelocidade chegar ao bom momento da atualidade e que poderiam ajudar caçula a encontrar um novo caminho.

A MotoGP tem sido apontada como exemplo na F1 (Andrea Dovizioso e Marc Márquez (Foto: Repsol))

1 – Divisão de receitas

 

Ao contrário do que acontece na F1, onde as equipes principais ganham uma fatia maior do bolo, a MotoGP procura dar repasses maiores aos times menores, ajudando, assim, a equilibrar as contas.

Em março passado, Ezpeleta deu uma entrevista à publicação francesa ‘Auto Hebdo’ e considerou que o modelo financeiro adotado na MotoGP funciona melhor.

“Nosso sistema é diferente do que é feito na F1, já que damos mais dinheiro às equipes privadas do que aos times oficiais”, disse Ezpeleta. “Essas equipes têm direito a apoio financeiro se decidirem fornecer uma moto para uma equipe privada. Nós encontramos algumas soluções para permitir que os times privados possam competir”, frisou.

Ainda em meados de 2016, Ezpeleta comemorou o fato de ter conseguido um caminho financeiro para garantir mais igualdade. Priorizando as equipes menores, a Dorna estabeleceu um teto no custo do leasing das motos e, além de repassar aos times privados dinheiro o bastante para essa despesa, também premia as fábricas que se dispõem a repassar suas máquinas.

Já para a temporada 2017, a promotora espanhola aumentou significativamente os valores repassados às escuderias satélites.

“Os times satélites eram a minha preocupação, então estou feliz em anunciar que, finalmente, encontramos uma fórmula que garante o suporte deles”, contou Carmelo na época em entrevista à publicação britânica ‘Bike Sport News’. “No ano que vem [2017], o suporte econômico aos times satélites vai aumentar 100% em comparação com este ano. O grid estará limitado a 24 vagas e, além das fábricas, os atuais sete times privados que estão correndo na classe rainha serão aqueles com o direito de controlar um time de MotoGP. Eles vão receber um bônus de €2 – 2,2 milhões (cerca de R$ 7,5 milhões) para cobrir os custos do leasing das motos, que está fixado em um máximo de €2,2 milhões”, explicou.

“Além disso, cada fábrica que disponibilizar motos para um time satélite também vai receber um bônus. Assim, nós esperamos mais estabilidade, mais competitividade e, no fim, ainda mais espetáculo”, justificou. 

MotoGP adotou modelo financeiro que favorece equipes privadas (Marc Márquez, Cal Crutchlow e Jack Miller (Foto: michelin))

2 – Leasing dos equipamentos

 

Este, aliás, é um ponto que poderia ser dos mais interessantes para a Fórmula 1. Já pensou como seria a série máxima da FIA (Federação Internacional de Automobilismo) se a Mercedes, por exemplo, pudesse fornecer seus carros para uma Racing Point, por exemplo? Ou se a Ferrari pudesse entregar seus bólidos à Haas?

Na MotoGP, é isso que acontece. E ainda com algumas variações. Em 2019, por exemplo, a SIC de Franco Morbidelli e Fabio Quartararo conta com motos da Yamaha quase que na configuração de fábrica: a moto do #21 começou o ano exatamente igual às motos de Valentino Rossi e Maverick Viñales, enquanto o #20 tem um protótipo com potência um pouco reduzida.

Na LCR, Cal Crutchlow conta com uma moto como a de Marc Márquez e Jorge Lorenzo, enquanto Takaaki Nakagami recebeu um protótipo do ano passado. A Ducati, aliás, fez um ótimo uso desse sistema para voltar ao trilho da competitividade. 

Ducati se beneficiou das concessões do regulamento (Danilo Petrucci, Álex Rins e Fabio Quartararo (Foto: Michelin))

3 – Concessões

 

A MotoGP competitiva de hoje é diferente de uns anos atrás. Graças ao apoio de Honda e Yamaha, principalmente, o Mundial de Motovelocidade conseguiu encontrar um caminho que não só ajudou a atrair mais fábricas ao certame, mas também que serviu para melhorar a competitividade.

Fábricas novas ou que vivem uma estiagem de pódios, são brindadas com concessões, que, por exemplo, permitem o desenvolvimento do motor ao longo do ano e tem um limite mais brando de testes com os pilotos titulares.

Isso, aliás, pode ser visto claramente no caso da Suzuki. Depois de um bom 2016, o time comandado por Davide Brivio perdeu essas benesses regulamentares para o ano seguinte e, por conta de um erro na escolha do motor, acabou condenado a uma temporada arrastando corrente. Com as concessões recuperadas, a Suzuki voltou aos trilhos e hoje é até partícipe na briga pelo título. 

Já pensou no que, por exemplo, aconteceria se a Williams tivesse mais chances de se desenvolver? 

Essa é uma medida, porém, que depende do apoio das fábricas. E a visão da MotoGP é consideravelmente diferente da F1. Já no fim de 2017, Livio Suppo, então chefe da Honda, defendeu que ajudar um rival em dificuldades é saudável para o campeonato.

“Honestamente, acho que ficou provado nos últimos anos que ajudar uma fábrica que está em dificuldades é bom para o campeonato”, opinou Suppo na época. “No fim das contas, todas as mudanças que a Dorna fez nos últimos anos foram, na minha opinião, positivas. No momento, a competição entre todas as fábricas é bem apertada e isso é bom para o show. Nesta temporada [2017] nós vimos muitos corridas indefinidas até a última volta e isso é muito importante para todos nós”, frisou. 

“A Suzuki teve dificuldades neste ano e se no ano que vem terá mais uma vez a possibilidade de acelerar o processo de desenvolvimento, isso é bom. O que a KTM fez esta temporada é incrível. Sem essa regra, seria impossível. Se agora temos todas essas fábricas correndo neste nível, uma próxima da outra, acho que isso é bom para todos nós”, completou.

Competitividade tem sido a marca da MotoGP (Fabio Quartararo e Danilo Petrucci (Foto: Michelin))

4 – Padronização de equipamentos

 

Uma das medidas que mais surtiu efeito para nivelar a competitividade do grid da MotoGP foi a adoção de uma eletrônica padronizada. O software unificado é mais simples do que a versão proprietária e, além disso, impede que aqueles com mais recursos financeiros ― as principais fábricas, no caso ― desenvolvam sua eletrônica muito mais do que os demais.

A Fórmula 1 já conta com alguns elementos padronizados, mas dar um passo além nesse quesito pode ser interessante. Já que as fábricas alegam que a evolução tecnológica é um aspecto chave do Mundial, um desenvolvimento conjunto poderia suprir essa necessidade. Na MotoGP, por exemplo, as fábricas podem contribuir com a eletrônica da Magnetti Marelli, mas é um benefício que acaba repassado às demais.

A Fórmula 1 chegou a cogitar a unificação das caixas de câmbio, uma mudança que pode ser interessante, já que, além de equilibrar o nível, também traz consigo um impacto financeiro.

Mas o Mundial hoje liderado por Lewis Hamilton tem uma filosofia própria e entende que cada construtor tem de produzir seus respectivos componentes. É uma questão complexa, claro, mas talvez um olhar mais carinhoso ajude a produzir efeitos em termos de espetáculo.

Pilotos têm voz ativa na MotoGP (Valentino Rossi (Foto: Divulgação/MotoGP))

5 – Formato de classificação que valoriza os treinos livres

 

È claro que treinos livres serão sempre treinos livres, mas o modelo da MotoGP acrescenta importância às sessões no quesito competitividade. No formato atual de classificação, os pilotos precisam mesmo buscar tempo nas três primeiras atividades livres, já que isso define a divisão dos grupos na classificação ― com os dez melhores no resultado combinado avançando direto para a fase final da classificação.

Além de assegurar o empenho de todos nas atividades de sexta-feira e sábado, o formato de classificação também garante tempo de TV para as equipes menores, que são maioria no Q1, por exemplo. Já é um argumento de venda interessante a ser explorado por aqueles que mais precisam correr atrás de dinheiro.

 

 

Paddockast #22
O que torna uma corrida de qualquer categoria legal? E chata?

 

Fábricas aceitaram concessões em prol da competitividade (MotoGP em Barcelona (Foto: Repsol))

6 – Escolha das pistas 

 

Não que a MotoGP não tenha algumas escolhas questionáveis, mas, ao menos na ampla maioria, os circuitos que integram o calendário oferecem boas corridas. Muggelo, Phillip Island e Assen, por exemplo, são pistas conhecidas por ‘corridões’. 

E, muito embora praças tradicionais sejam uma constante na programação, o Mundial não teme abraçar o novo, mas, quando o faz, não se prende apenas por questões financeiras. A introdução da Tailândia, por exemplo, tem um peso enorme no argumento econômico, já que é um dos mercados mais importantes para a indústria de motos, mas os fãs também pesam nessa equação. O país asiático é apaixonado pela MotoGP e, assim, vem com a garantia de casa cheia.

No caso da F1, algumas pistas, ainda que tradicionais, pecam bastante no quesito competitividade. No último domingo, por exemplo, a passagem por Paul Ricard deixou muito a desejar. O mesmo aconteceu em Barcelona, um circuito que, pelo menos por enquanto, deve ficar fora da programação do próximo ano.

Mônaco também não oferece lá disputas primorosas, mas é uma pista tradicional da categoria e, claro, a história deve ser preservada. Mas como apresentar argumentos em defesa de Abu Dhabi? E de Sóchi?

Uma escolha melhor de circuitos poderia ajudar também no quesito espetáculo.

Pistas também contribuem com o espetáculo (Marc Márquez e Danilo Petrucci (Foto: Repsol))

7 – Punições poucas e rápidas

 

Não é muito comum ver punições causando polêmicas na MotoGP. Normalmente, as sanções são poucas e, quando acontecem, raramente interferem no resultado da corrida. Especialmente após a bandeirada.

A F1, por sua vez, ainda vive o impacto da vitória perdida por Sebastian Vettel no GP do Canadá. Deixando de lado a necessidade ou não da pena de 5s, a forma como aquilo foi feito foi mesmo a melhor? Como bem disse Max Verstappen, a decisão da FIA (Federação Internacional de Automobilismo) matou a diversão da corrida em Montreal, já que Lewis Hamilton não tinha motivo para atacar o rival da Ferrari. Ele apenas precisava se manter próximo o bastante para a vitória cair no colo.

Se é para punir, melhor que seja de uma maneira que permita ao sancionado uma reação. Se Vettel tivesse, por exemplo, de cumprir algo como a recém-inventada punição da volta mais longa, ele teria como manter o resultado?

Suzuki foi uma das fábricas que tirou proveito das concessões (Joan Mir e Alex Rins (Foto: Suzuki))

8 – Pilotos com voz ativa

 

Esse é um ponto importante da MotoGP. Por lá, os pilotos são participativos e tem voz ativa. Eles, por exemplo, foram consultados pela FIM na tentativa de criar uma medida mais justa para as punições. A volta longa supracitada, por exemplo, só foi introduzida após ser testada e aprovada por eles.

No ano passado, quando do cancelamento do GP da Grã-Bretanha, a Dorna deu aos pilotos a decisão de definir o que fazer.

Todavia, não basta que os competidores tenham esse direito, é preciso que eles o exerçam. Recentemente, a FIA quis ouvir os pilotos no debate sobre as regras de 2021, mas apenas Lewis Hamilton e Nico Hülkenberg compareceram. E o resto?

Na MotoGP, existe já há muitos a chamada Comissão de Segurança. Os pilotos se reúnem toda sexta-feira, ao fim dos treinos livres, para debater aspectos relacionados à corrida anterior e a atual. Foi de lá, por exemplo, que saiu a decisão de mudar o layout de Barcelona após a morte de Luís Salom. 

Muito embora as fábricas tenham um papel central na Fórmula 1, os pilotos são igualmente protagonistas do espetáculo e podem ― e devem ― ter um papel ativo na tomada de decisões. Quem melhor do que eles para ajudar na busca por soluções que beneficiem as disputas?

O público faz perguntas aos pilotos por meio das redes sociais (MotoGP em Mugello (Foto: KTM))

9 – Aproximação com os fãs

 

A aproximação dos fãs do esporte também pode ser um caminho interessante. A MotoGP, por exemplo, introduziu em suas coletivas de imprensa de quinta-feira perguntas feitas pelo público. 

Dias antes, a categoria rainha anuncia nas redes sociais quem serão os pilotos presentes e divulga hashtags para que as perguntas sejam enviadas. A organização, então, seleciona e, ao fim da coletiva, a repórter Amy Dargan assume o microfone para sanar as dúvidas do público.

Ao contrário dos profissionais da imprensa, que normalmente fazem perguntas relacionadas à performance ou à competitividade, os fãs têm outro tipo de curiosidade e dão um tom mais descontraído para a sessão. 

Tornar os pilotos mais humanos é um caminho interessante para atrair a simpatia de uma nova geração de fãs.

Eletrônica padrão foi um avanço importante na MotoGP (Jorge Lorenzo e Marc Márquez (Foto: Red Bull))

10 – Redes sociais

 

No mundo de hoje, difícil imaginar alguém longe das redes sociais. E, no que diz respeito às categorias de esporte a motor, a MotoGP foi pioneira neste quesito e hoje faz um amplo trabalho nesse segmento.

Ainda em 2016, por exemplo, a MotoGP recebeu do YouTube o chamado ‘Gold Play Button’, um prêmio concedido a usuários que ultrapassam a marca de 1 milhão de inscritos. Hoje, já são mais de 2 milhões de inscritos no canal.

No Twitter, por sua vez, a MotoGP também tem presença maciça. Além de publicar suas notícias, a categoria, que tem 2,5 milhões de seguidores, também divulga fotos, vídeos, conteúdos especiais e materiais divulgados pelas próprias equipes. No Instagram, onde o número de seguidores passa de 7,5 milhões, a estratégia é semelhante.

No Facebook, a MotoGP volta ao passado e até mesmo exibe corridas clássicas na integra. Por lá, são 13 milhões de curtidas.

No caso da F1, os números são um pouco diferentes. O canal do Youtube conta com 2,4 milhões de inscritos. No Twitter, são 3,9 milhões de seguidores, contra 7 milhões no Instagram. No Facebook, a série das duas rodas têm 8,1 milhão de seguidores.

As séries, porém, têm estratégias diferentes e o envolvimento da F1 é bastante mais recente que o da MotoGP.

Divisão de receitas também é chave na competitividade (GP do Catar de 2019 (Foto: Suzuki))

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