O GRANDE PREMIUM foi a São Bento do Sul entender a paixão do povo por um autódromo de terra. É que a poeira que levanta é o ar que eles respiram

É por uma estrada sem asfalto, estreita, sinuosa e no meio de um enorme bosque de Araucárias que se chega ao Autódromo Municipal Lourenço Schreiner. A entrada é simples, não há cancelas ou catracas, só a simpatia de quem pergunta sobre os ocupantes do carro. Já dentro do circuito, é difícil percorrer o curto caminho de lama entre o portão principal e a casa que serve como apoio para as corridas na terra.

A trajetória vem acompanhada do inconfundível cheiro do churrasco, das costelas sendo assadas no espeto, no chão, em meio a uma fogueira. Há barracas, caminhonetes, ônibus e motorhomes por todos os lados, pessoas andando de lá pra cá, crianças. De repente, surgem os boxes, cheios também, devidamente divididos e cobertos em um paddock lotado. Complicado saber quem é piloto, mecânico, amigo ou simples alguém que está passando por ali, atraído pelo som dos carros, pelas peças expostas, pela correria de quem tenta competir.

Assim é a pista de São Bento do Sul – que, na verdade, também pertence ao município de Campo Alegre. Ambas localizadas na porção norte de Santa Catarina, estado célebre pela força e tradição de provas na terra.

E isso ficou bem claro em meados de fevereiro, quando o São Bento Motor Clube decidiu, sob a batuta do empresário Rafael Almeida, reeditar uma famosa prova noturna, que foi disputada ali 25 atrás. A nostalgia dos anos 1980 e o entusiasmo de correr à noite, em meio à floresta e na pouca visibilidade, atraiu gente de todo o lugar e encheu o autódromo, para uma prova que, originalmente, deveria durar três horas e mais uma volta.

As garagens eram quase intransitáveis, assim como as áreas destinadas ao camping. Cerca de três mil pessoas compareceram no Rio Represo para ver de perto carros clássicos, modelos um pouco mais jovens e protótipos cruzarem a terra.

Tudo foi pensado cuidadosamente. O reparo e manutenção do ‘palco’ levou seis meses para ficar devidamente pronto. A divulgação foi insistência e incansável. Preços de ingressos acessíveis, diversões extras e as áreas para o público aproveitar um fim de semana inteiro.

Só São Pedro mesmo não entendeu a brincadeira. Ainda assim, ninguém saiu triste. Mas essa é uma história para daqui a pouco.

A iniciativa de retomar a prova noturna veio da ideia de se fazer algo novo. Quem explica é Rafael Garcia, o popular Tupagão – que não parou um segundo durante os três dias do evento que organizou. Empresário, nascido e criado em São Bento, Rafael conta que tudo levou sete meses, da ideia ao grande dia. 

“Não se tem provas de endurance na terra. Na verdade, Joaçaba foi a primeira, é a pioneira. Eles fizeram uma corrida em janeiro agora, mas foi diurna, mas a gente já tinha pensado em fazer a noturna. Então, o que a gente queria era montar um evento bacana, para chamar as famílias, trazer as crianças”, explica Garcia ao GRANDE PREMIUM.

“Foram sete meses de preparação”, completa. E a maior dificuldade? A pista. “Tivemos de mexer muito nela, colocar material em cima, e isso quase todo o fim de semana. Levou quase seis meses tudo isso. É a parte mais difícil. Depois, tem a divulgação e deixar tudo pronto.”

Mesmo antes de finalizado evento, Rafael festejou. “Foi um sucesso. Veio muita gente, mais do que esperávamos, embora o grid da prova noturna não tenha sido tão grande, mas talvez só por três ou quatro carros”.

Mas tudo tem um segredo. E ali o segredo está na amizade e no amor pelo esporte. Quem disso isso foi o Rafael, mas ele não foi o único a citá-la durante a passagem do GP* por São Bento.

Clima dos boxes vale mais que a corrida

 

A frase é de Francis Henrique Trennepohl. Piloto experiente na terra – e querendo fazer sua última corrida -, foi a São Bento correr com um Passat, dividindo o volante com outros dois pilotos/amigos, impulsionado pela reedição da corrida e do desafio de correr à noite.

De acordo com o catarinense, “tudo dá para fazer, mas desde que exista a vontade e a paixão pelo negócio”. E parece ser assim mesmo. Todo mundo dá um pouco. Vive-se o automobilismo com amor, virando noites trabalhando nos carros, viagens longas, sono sempre interrompido nos boxes ou em barracas improvisadas, a comida também é servida ali mesmo. Todo o esforço é válido para fazer o carro, ao menos, terminar a prova.

“Aqui é um pouco de tudo, ajuda daqui e dali, amigos que patrocinam com o que tem, a gente que tira do bolso, dorme nos boxes, traz a família e curte, acima de tudo”, diz Trennepohl.

“A marca principal aqui é a perseverança. Não existem grandes patrocinadores , praticamente todo mundo faz investimento do bolso. No nosso aqui, a oficina fica na casa do preparador. Ele trabalha de noite, aos fins de semana… Você pode ver que o carro é jornal de classificados, cada um deu um pouquinho. É isso aí”, emendou.

São empresários, médicos, advogados, jornalistas, atendentes, operários, pedreiros. Todos misturados nos boxes lotados, revirando e trocando informações. Peças e equipamentos também são compartilhados, assim como um empurrão aqui e ali até o carro pegar mesmo e sair do pit-lane.

E foi em um desses boxes apertados do Lourenço Schreiner é que estava Christiano Bornemann, piloto de Curitiba e que tem uma carreira bastante sólida nas competições na terra. O paranaense veio do asfalto, como muitos, mas se apaixonou pelo clima improvisado e cordial da terra.

Esporte amador, pessoas profissionais

Bornemann auxiliava uma equipe concorrente quando começou a falar da parceria que existe nessas categorias. “Os mecânicos e os preparadores também têm suas profissões, mas se dedicam ao carro durante a semana no tempo livre e trabalham sem parar nos fins de semana para tornar tudo isso possível. Eles abrem mão, muitas vezes, da família, dos amigos… Então, não tem como eu tratar isso aqui de forma amadora. Então, isso aqui é pessoal e profissional ao mesmo tempo”, afirma.

“A gente disputa na pista, cada um quer vencer, claro. Mas existe um companheirismo, você acompanha o que o seu adversário está fazendo e também tenta ajudar. Não fecha os olhos para isso, não é um problema só deles. As equipes se ajudam para que aquele carro consiga voltar para a prova, mesmo que ele não tenha mais a chance de vencer. A primeira meta é sempre vencer e a segunda é terminar. Então, tudo isso premia o esforço de quem trabalha nas equipes”, acrescenta o Christiano, que participa dos campeonatos em Santa Catarina desde 2011.

Empresário do ramo de peças automotivas, Bornemann também explica que, além do clima nos boxes, também existe o desafio constante que só um circuito de terra produz. “Os campeonatos de terra têm como diferencial o fato de que a pista nunca é a mesma, o clima tem muito mais influência, as outras corridas mudam a pista. E isso que me motiva mais aqui."

“Tudo bem que é o mesmo circuito, mas cada vez que você entra, tem uma particularidade”, completa.

 

Até restando 1 minuto

 

São Pedro não queria uma prova noturna em São Bento. Depois de um calor escaldante na sexta-feira, o sábado veio abafado e, com ele, a consequente chuva típica do verão. E choveu forte na tarde daquele sábado, 20 de fevereiro. O aguaceiro mudou a programação, não teve jeito. A direção de prova tentou de tudo quando a água parou de cair do céu. Muitos veículos pesados andaram pela pista e até os espectadores foram chamados para andar. Os fiscais também fizeram exaustivas análises.

O esforço quase deu certo. Perto das 21h, a pista estava pronta, os carros já haviam feito o treino de aquecimento, estavam alinhados, mas aí a chuva voltou. E todo o balé para colocar os competidores na largada ao estilo de Le Mans foi em vão. A segurança veio em primeiro lugar. A corrida noturna teria de ser adiada para o domingo.

No dia seguinte, o calor voltara, assim como o temor de uma nova chuvarada. Dessa forma, os comissários agiram rápido e decidiram autorizar a largada ao meio-dia, também pensando na prova que acompanhava o evento, a 1ª Taça São Bento.

 

Novamente no estilo da famosa corrida francesa, a segunda corrida noturna, que foi disputada de dia teve início. A disputa mais acirrada foi entre as categorias Marcas Injetado e Carburado. Mas a prova viveu outros dramas.

Enquanto uma porção de gente aplaudia a disputa entre os Gol bolinha na ponta na arquibancada da reta principal e no muro, um outro grupo dentro dos boxes acompanha o trabalho do Passat #95, que insistia em terminar a corrida.

Integrante da categoria Clássico, o carro já vinha apresentando problemas desde a noite anterior, quando os faróis falharam pouco antes da formação do grid. De dia, a culpa foi do calor. O sistema de alimentação também foi um problema. Carburador e bomba de combustível deram uma dor de cabeça à equipe. O Passat, de Trennepohl, Patrick e Ivan, voltou várias vezes aos boxes.

E todas às vezes, era ajudado por todos ao redor. O narrador falava em um minuto para o fim da prova, quando o Passat retornou à pista pela última vez. Não conseguiu completar a volta toda, mas foi como uma missão cumprida para quem estava nos boxes.

“O carro apresentou muitos problemas, mas correr aqui é assim mesmo. Temos de tentar até o fim”, conta Francis, orgulhoso de ter feito a última perna da corrida, que durou 2h ao invés das três inicialmente previstas.

E o vencedor? O vencedor foi Gefferson de Lima, guiando o Gol #32 da RB Motorsport. “Não tenho palavras para descrever essa vitória. Estou muito emocionado”, falou o paranaense, que ganhou pela primeira vez em competições de terra em São Bento. “São três anos tentando, realmente não sei o que dizer e só tenho a agradecer.”

Ano que vem tem mais. E quem garante é a organização. “Depois de tantos inscritos, público, queremos fazer todo ano”, diz Garcia.

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